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CATÁLOGO NACIONAL DA REDE DE CLUBES CIÊNCIA VIVA NA ESCOLA
MENSAGEM
DO MINISTRO DA CIÊNCIA E
TECNOLOGIA E ENSINO SUPERIOR
Manuel Heitor
Dizem-nos que a ciência é o único alerta para os riscos que emer- o surpreendente, por contrariar a tendência europeia num sentido positivo,
gem: será então possível desafiar a mudança? é que apesar desta forte tendência exterior ao próprio sistema de ensino,
a análise mostra que a fração dos jovens (no ensino secundário) que têm
No contexto bem atribulado e particularmente inédito em que vivemos – optado no 10.º ano pelas áreas científicas cresceu desde 1996, segundo um
o de uma crise pandémica –, recordar os princípios da ciência moderna e padrão a que temos chamado de “efeito Ciência Viva”! Referimo-nos a um
tudo aquilo que sabemos que a escola deve ensinar nunca é demais. A este programa que acreditamos ter introduzido sobretudo formas de diálogo
propósito, Umberto Eco escreveu que “o saber não é culpado pelo orgulho aberto, trazendo casos concretos para discussão entre alunos, educadores,
demoníaco com o qual caminhamos para a possível destruição”, e que “é a pais e investigadores, de uma forma que nos faz perceber melhor as afirma-
ciência a única alerta possível para os riscos” que emergem. Eco referia-se, a ções de Umberto Eco.
título de exemplo, aos progressos da astrofísica moderna e, sobretudo, aos
erros entretanto divulgados pelo célebre cientista Stephen Hawking sobre a Amplificar e reforçar este efeito exige alargar a rede de Centros Ciência Viva
sua própria teoria dos buracos negros dos anos 70, no momento em que se a todas as escolas através da instalação de Clubes Ciência Viva, que esta pu-
preparava para fazer as devidas correções diante de uma comissão científica. blicação tão bem reconhece.
Naturalmente que o processo não traz qualquer novidade para aqueles que Naturalmente que a discussão dos direitos individuais de todos os cidadãos
praticam ciência, nomeadamente a nível internacional, mas (como advoga à aquisição e atualização de competências deve ser realizada num contex-
Umberto Eco) “deveria ser levado ao conhecimento dos jovens de todas as to alargado, compreendendo naturalmente esses direitos, mas também os
escolas (não fundamentalistas e não confessionais)” para que possam refletir deveres sociais e morais de aprender. Deste modo, o diálogo que os Clubes
sobre os princípios da ciência moderna. Ciência Viva têm lançado nas escolas passa por encarar uma nova cidadania
Considerando as interrogações sobre o futuro, parece-nos de facto ser crítico – para a qual a educação é naturalmente um direito –, e aprender um dever
facilitar a compreensão dos valores essenciais a uma sociedade mais justa e moral.
equilibrada, mas também os valores para os quais temos de compreender Nesta altura, interessa sobretudo considerar que, num contexto de crescen-
a forma de educar os nossos filhos e afirmar a competitividade das nossas te e contínuas mutações sociais, económicas e tecnológicas, a reivindicação
empresas e instituições. para a promoção da qualidade de vida, da solidariedade social e da inova-
Será que tem interesse desafiar os mais jovens a perceber os riscos que ção deve ser compreendida sobretudo em termos do processo de apren-
emergem e a aprender, apreender e empreender com base em princípios dizagem, e não apenas num inventário de matérias ou de prioridades. Mais
científicos? Qual o seu verdadeiro significado face aos desafios dos merca- importante que especificar sectores de intervenção, interessa compreender
dos que emergem, ou dos hábitos de consumo acelerados que invadem as como promover competências, sobretudo no que respeita à necessidade de
nossas rotinas diárias, ou mesmo das imagens aterradoras com que nos de- conciliar o desenvolvimento de competências nucleares em matérias tradi-
frontamos perante écrans de televisão que constantemente nos mostram as cionais com competências em tecnologias de informação e competências
rotinas do “mal”? Mas será preferível relembrar apenas as vantagens do de- sociais, e com o estimular da capacidade de empreender.
senvolvimento científico e tecnológico, por exemplo na saúde, mas também Neste contexto importa relembrar que, também com a evolução da pande-
nos transportes, ou na construção do nosso habitat? mia, estamos a compreender melhor que “a ciência cura”, mas também que a
É exatamente da necessidade de questionar a ciência e a tecnologia e de ciência é um “campo de batalha”.
provocar a capacidade de aprender a compreender as suas limitações que E para que a batalha se alcance impõe-se dar atenção ao conhecimento e à
foi promovido nas sociedades mais desenvolvidas (e em Portugal), sobretu- aprendizagem. Este é o papel dos Clubes Ciência Viva nas escolas. Ou seja,
do desde a segunda metade da década de 90, o debate com pais e educado- estimular os mais jovens a fazer melhores perguntas, que só podem ser feitas
res sobre o desenvolvimento da cultura científica e tecnológica. com um esforço de articulação coletiva e transdisciplinar, percebendo a sub-
Qual é o impacto deste debate em Portugal? Para tentar responder a esta tileza das interações sociais e das atitudes individuais, de modo a formalizar
pergunta, recordemos então alguns simples factos e feitos da sociedade adequadamente as perguntas a que a ciência deve tentar responder, privile-
portuguesa durante as últimas décadas. Sabemos que enfrentamos em Por- giando, sempre, uma atitude humanista.
tugal e no Sul da Europa um progressivo envelhecimento demográfico. Mas
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